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6 anos após PEC das Domésticas, a maioria das trabalhadoras está sem carteira assinada

Seis anos após a PEC (Proposta de Emenda Constitucional) das domésticas, o número de trabalhadoras do ramo com carteira assinada está no nível mais baixo desde 2012. Apenas 1,779 milhão trabalham com carteira assinada, enquanto 4,476 milhões trabalham sem carteira assinada no Brasil, segundo o IBGE.

A emenda garante aos trabalhadores domésticos o recebimento de um salário mínimo ao mês, férias, recebimento por hora extra, um local de trabalho que respeite normas de higiene, segurança e saúde, e jornada de trabalho de 8 horas diárias. Com a carteira de trabalho assinada, as secretarias recebem auxílio-doença, licença maternidade, FGTS, seguro-desemprego e entre outros.

Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), 6 milhões de pessoas no Brasil deixam suas próprias casas para cuidarem do lar de outra, sendo o país que mais tem empregadas domésticas no mundo. A conclusão de especialistas é que as alterações legislativas são um avanço mas não mudaram a realidade dos trabalhadores desse ramo.

Cláudia Maria Costa. 46.

Cláudia Maria Costa, 46, trabalha há três anos na mesma casa e diz preferir ser diarista, mesmo sem carteira assinada, por que está mais fácil para ser contratada para fazer faxina do que ser empregada doméstica. O advogado Wesley Lima Verde afirma que isso tem explicação. “Creio que grande parte das trabalhadoras continuam atuando na informalidade devido a recessão do país. Por conta disso os empregadores preferem a informalidade, como forma de evitar despesas. Uma empregada doméstica informal sai mais barato para o empregador do que uma empregada, devidamente registrada”, explicou .

“Eu cozinho, limpo e passo roupa, mas não acho justo o salário que eu recebo pelo serviço que eu faço” diz Claudia. A maior dificuldade do emprego hoje é o transporte público. “Uma hora e meia para ir ao trabalho dependendo do dia, na volta para casa é pior, pois se eu sair mais tarde do trabalho eu perco o ônibus e demora a passar outro da mesma linha”, relata.

A diarista também faxina sua própria casa, depois do trabalho e lamenta não ter tempo suficiente para fazer atividades com o filho, que já trabalha no período contrário ao da escola para ajudar nas contas de casa. “Eu entro às 8h e saio às 17h, meu tempo é muito corrido não tenho horário de almoço, então faço minha refeição em quinze minutos e volto as atividades da casa”, conta Claudia.

Realidade das domésticas

Francineide Silva, 37.

“Não tinha outra saída eu precisava trabalhar, deixei meu filho em casa para cuidar do filho da patroa e quando me dei conta da situação o meu filho já estava envolvido com o crime”, relata Francineide Silva, 37, que trabalhou por 7 anos, sem carteira assinada como empregada doméstica em uma casa de família em Vicente Pires. Sua carga horária era de 10h por dia e não sobrava tempo para dar devida atenção a rotina de seus filhos.

Francineide decidiu mudar de emprego após seu filho mais velho ser preso e também por achar pouco o salário que recebia para todo o trabalho que prestava, ela relata que recebia um valor fixo de R$150 por dia e não era acrescentado caso o seu horário se estendesse. O serviço pesado de lavar, passar, cozinhar e cuidar das crianças lhe ocasionou dores fortes pelo corpo e rinite alérgica por conta do produtos de limpeza mas diz nunca ter tirado dia de folga para procurar ajuda médica. Ao pedir demissão da casa de família, não teve nenhum de seus direitos assegurado.

Atualmente trabalha como auxiliar de serviços gerais em uma creche perto de sua casa em Ceilândia, apesar do aumento de uma hora em sua carga de trabalho, para ela suas maiores conquistas foram o direito da carteira assinada e poder acompanhar a rotina de seus filhos por morar perto do emprego.

Quando lhe é questionada sobre os direitos trabalhistas que a categoria de empregadas têm, ela afirma “melhorou um pouco, hoje a gente tem direito de férias e seguro-desemprego e outras coisas que eu me sinto mais valorizada”, ela relembra que sempre deixou de ir nas reuniões das escolas dos filhos porque o patrão não deixava. Seus filhos sempre estudaram em escola pública e passavam o período do contraturno escolar em projetos sociais, e em casos emergenciais ela levava o filho para o serviço ou ficava em casa com os outros irmãos.

Euzelina Conceição, 42.

“A minha maior dor é não estar em casa quando o meu filho de 11 anos sai e chega da escola”, disse Euzelina Francisco da Conceição, 42, mais conhecida como ‘Lina’. Ela é nascida em Paranã-TO e veio para o Distrito Federal quando tinha apenas 7 anos.

Lina é atualmente moradora do Riacho Fundo e trabalha como empregada de segunda a sexta na casa da mesma família há 25 anos na Colônia Agrícola Samambaia. Ela conta que já trabalhou como boleira e atendente, mas acabou voltando a trabalhar em residências.

A tocantinense se emocionou ao falar sobre a ajuda que recebe de seus patrões. “Além de eu ter carteira assinada, os meus patrões me ajudam muito, com alimentos, com meu filho, com a minha casa”, conta. Além de receber auxílio transporte, como está previsto em lei, ela afirma que muitas vezes os patrões a deixam em casa.

Ao ser questionada sobre a difícil realidade da maioria das empregadas domésticas no país, Lina afirma, “Sou privilegiada e tenho sorte, pois sei que na maioria das casas de família não é assim que acontece, tem muita gente que maltrata e trata com indiferença as funcionárias do lar”.

Laura Moura, 31.

Laura Cristina Moura, 31, trabalha como empregada desde os 18. Moradora do Riacho Fundo, Laura lava, passa, cozinha, cuida de criança e arruma uma casa de família em Águas Claras. Trabalha de 8 às 18h, e faz hora extra quando necessário, mesmo assim ainda acha tempo para cursar gastronomia na faculdade Iesb, “mas quando falo que sou empregada doméstica já me olham diferente”, desabafou.

“As pessoas gostam de colocar a gente pra baixo, me perguntam por que eu trabalho de doméstica e falam que eu poderia estar em outro lugar, por que eu faço faculdade, mas a gente tem que fazer o que gosta e o que pode”, disse. Laura relata que com seu salário consegue viver bem, mas não pode ter um plano de saúde.

Atualmente está há 4 anos na casa em que trabalha. “Trabalhar de carteira assinada é ter segurança para o dia de amanhã e tem mais referência para o próximo serviço”, apesar de já ter trabalhado como lavadeira de roupa, frentista e serviços gerais, não pensa em mudar de profissão e nem a prestar serviço como diarista.

Aumento das diaristas

Empregadores têm optado por contratar diaristas informais; que são trabalhadoras com uma situação mais instável e precária, pois são remuneradas apenas pelo dia de trabalho e não possuem carteira assinada. “A PEC é um avanço desde que as secretarias passem a conhecer os seus direitos e exijam a carteira assinada. A lei veio para trazer benefício e respeito para os trabalhadores domésticos; porém a sociedade ainda peca na valorização desse profissional”, relatou Marcílio Alves advogado especializado.

Domésticas que saíram do emprego vão atrás de seus direitos, “por essa razão a Justiça do Trabalho está cheia de reclamação trabalhista nesse sentido”, completa.

“Afirmar que a PEC das empregadas domésticas mudou a realidade dessa categoria é complicado. O direito agora previsto na Constituição Federal, garante o acesso à justiça e preserva a segurança jurídica das trabalhadoras. Contudo a desinformação e a falta de conhecimento das leis compromete o alcance dos direitos positivados”, relatou o advogado trabalhista Wesley Lima Verde.

O número de empregadas domésticas com carteira assinada diminuiu e o número de empregadas que atuam sem vínculo ou como diaristas tem aumentado. Os trabalhadores domésticos ainda têm dúvidas de todos os direitos que conquistaram e a desvalorização da profissão impede que esses direitos sejam efetivados.

Por Beatriz Souza, Gabriella Bontempo, Letícia Perdigão e Milena Carvalho

Supervisão de Luiz Claudio Ferreira