Dentre os milhares de apaixonados pelos clubes e pelo esporte, seis torcedores compartilharam suas paixões, histórias, cotidianos e expectativas em função do futebol e de seus respectivos times do coração.
“O futebol é a coisa mais importante entre as menos importantes. Então cabe a reflexão desse momento, por mais que a gente ame futebol e viva por ele”. Essas são as palavras de Nathan dos Santos Masson, torcedor fanático do Botafogo (SP), da cidade de Ribeirão Preto. Elas ilustram um sentimento de torcedores diante da falta de partidas no Brasil, que foi suspenso em março, e ainda não tem previsão de volta, por conta da pandemia do coronavírus.
“O negócio que tá acontecendo é tão sério que a última coisa que eu tô pensando é no futebol”, disse Pedro Henrique Fonseca, torcedor fanático do Botafogo (RJ), que colocou o time não só como prioridade de entretenimento, mas como uma forma de trabalho nos últimos três anos através de seu canal no YouTube e página no Instagram, o “Setor Visitante”. Esse momento abordado por eles também é vivido por muitos outros torcedores fanáticos Brasil afora, que passaram a tentar se acostumar com a falta de jogos.
Direto de General Severiano
Pedro Henrique Fonseca, 36, é um torcedor fanático do Glorioso, paixão que veio de berço, mais especificamente do pai, apaixonado por futebol. Indo juntos ao estádio, os jogos eram o principal momento de interação entre pai e filho. Segundo ele, nasceu e cresceu em uma época onde frequentava jogos de todos os times, sempre presente nos grandes jogos e clássicos que aconteciam na cidade. A partir daí, se envolveu mais com o futebol e, principalmente com o Botafogo, o que o levou futuramente a acompanhar o clube em todos os jogos fora de casa, e, mesmo que pareça um excesso, ele rechaça. “Às vezes, aos olhos dos outros pode ser, ‘caramba, esse cara aí vai há 3 anos em todos os jogos fora de casa, esse cara é louco’, mas pra mim é normal”.
Entretanto, apesar do afeto pelo Fogão, enquanto muitos torcedores buscam diversas maneiras para suprir a ausência do time, Pedro sequer pensa nisso. “O negócio que tá acontecendo é tão sério que a última coisa que eu to pensando é no futebol. Estão morrendo mil pessoas por dia. Então eu acho um absurdo, como estão fazendo aqui no Rio de Janeiro, forçando, com apoio e respaldo de Brasília, para fazer com que volte o futebol aqui”.
Ao ser questionado sobre a postura do Botafogo quanto a possível retomada dos jogos, Pedro entende que não é momento de voltar. “A posição do Botafogo inicial e atual eu concordo, e sem brincadeira, se forçarem pra voltar a jogar em 15 de junho, morrendo mil pessoas por dia, não joga, perde, seja desclassificado, cai pra segunda divisão”. O botafoguense acredita que a retomada dos jogos e com torcida só seria capaz após a descoberta de uma vacina, e voltar com as competições antes disso seria uma “irresponsabilidade e loucura”.
Amor sem fronteiras
Ariane Menegaro Biondi, 35, mora em Dublin, na Irlanda, e, mesmo de longe, nunca deixou de acompanhar o São Paulo. Influenciada na torcida pelo pai desde pequena, ela conta que já até enrolou o chefe para ver um jogo do time pela Libertadores. Ainda que Ariane viva em um lugar onde a realidade é muito distante da do Brasil, ela acredita que o momento ideal de volta não seja agora por conta da experiência vivida por ela durante o lockdown na Irlanda.
De acordo com a torcedora, que acompanha as notícias do Brasil, ela discorda de qualquer possibilidade de volta. “Enquanto o governo não falar que pode sair de casa com segurança, não dá pra sair. Eu acho que o Brasil ainda vai demorar muito pra voltar o futebol, e, quando voltar, acredito que vai ser sem torcida. Talvez apenas no ano que vem a gente consiga voltar a ver o futebol com torcida”, explicou Ariane.
Galo na veia
Apaixonado pelo Atlético Mineiro, Sávio Carvalho Deotti, 22, se diz torcedor do clube ainda na barriga da mãe. “O Galo é literalmente uma paixão que vem de berço. Desde o ultrassom confirmando que era um menino, meu pai e meu avô já diziam ‘vem aí um atleticano”, explicou. De acordo com ele, o que mais o motiva em ir aos jogos é o apoio ao time, que pode mudar o rumo de uma partida. “Eu realmente acredito que a torcida faz a diferença e ganha o jogo”.
Sobre a volta do futebol, Sávio se mostrou cauteloso. “Compreendo a iniciativa de retomar às atividades, mas vejo como um equívoco, principalmente em alguns estados do país, onde a curva de casos/mortes se mantém ascendente”. O Atlético retornou recentemente aos treinos, e o alvinegro comentou o assunto. “A retomada com responsabilidade é viável ao meu ver, tanto que já foi feita. Apesar disso, acho que deve haver extrema cautela, principalmente dos jogadores, que podem comprometer todo elenco por irresponsabilidade.
“Eu acredito” marcado na história
Com sua paixão despertada pelos seus irmãos mais velhos, João Victor Barros, 18, é fanático pelo Atlético Mineiro. “Minha maior motivação é estar na arquibancada apoiando o time o jogo inteiro, e sempre revendo meus amigos na torcida”, disse o atleticano sobre sua paixão que o motiva a ir nos jogos no Independência e no Mineirão.
Para o atleticano, o hábito de ir aos jogos toda semana começou três anos atrás. “Quando ganhamos a Libertadores, em 2013 eu senti uma felicidade enorme, mas era muito novo. Comecei a frequentar estádio em praticamente todos os jogos em meados de 2017. A ansiedade para ir e curtir a vibe de um jogo logo, e a felicidade que eu sinto, me fazem querer estar lá (no estádio) toda semana”
Mesmo convivendo com a falta do time do coração, João Victor acredita que agora não é a hora de voltar com o futebol. “A paralisação deve se prolongar o máximo possível para diminuir o impacto da doença, não importa quanto tempo demore. O clube (Atlético-MG) recentemente voltou com os treinos. Eu achei precipitado, mas é menos mal do que voltar com os jogos”, completou.
Paixão pelo Mecão
Diferentemente dos demais, Raphael Igor, 24, não herdou a sua paixão pelo América de Natal da família. Quando pequeno, era torcedor do Flamengo, devido majoritariamente à influência do clube carioca na TV nordestina. Até que em 2006 ele foi ao seu primeiro jogo do América, e lá desenvolveu um sentimento pelo clube potiguar, o qual foi concretizado apenas em 2007, quando suas duas paixões se enfrentaram nos gramados, e, por conta de uma provocação do atacante Souza na vitória rubro negra, Raphael decidiu optar por torcer para o time alvirrubro, que segundo ele, a paixão bateu mais forte.
Raphael considera a volta “totalmente sem nexo”. “Acho que essa situação para o América é complicada, por conta do lado financeiro e porque o time depende muito da bilheteria. Todos os patrocínios estão parados e isso dificulta. Mas se for pra voltar, precisa ter um plano de retomada de campeonato, como um todo, porque não adianta o América e o ABC voltarem e os outros times não. A verdade é que estamos em uma encruzilhada”.
Em relação à retomada dos jogos com torcida, Raphael se mostrou receoso inicialmente, mas torce por uma melhora futura. “Como a Arena das Dunas é grande e o público não ocupa todo o espaço, tenho certeza que todo mundo vai tentar evitar (contato) ao máximo possível. Mas o problema é que, quando a cerveja entra, todos querem se abraçar, aí fica complicado. O pessoal que é mais consciente deve ir de máscara no início, mas depois, com o tempo, o ambiente vai voltando ao normal”.
Fanatismo pelo Tricolor do interior paulista
Nascido e criado em Ribeirão Preto, Nathan dos Santos Masson, 29, também herdou a paixão pelo Botafogo-SP do pai, mas destaca que, no interior de São Paulo, a cultura de torcer por times da região é muito forte. Segundo ele, o carinho pelo ‘maior do interior’ foi reforçado e concretizado, por incrível que pareça, após o rebaixamento do Botafogo para a Série A3 do Paulistão em 2005. “Realmente é no sofrimento que a gente percebe que gosta. Comecei a ir sozinho aos jogos também, criar uma independência e explorar mais o lado de torcedor”, comentou.
Há mais de 10 anos com o Botafogo em viagens e caravanas, Nathan teve a oportunidade de visitar quase todos os estádios do interior paulista, e apesar de não gerar conteúdo, tem seu perfil em redes sociais e, segundo ele, acaba “postando uma coisa ou outra” referente aos jogos. Além disso, o torcedor é diretor de comunicação da Fiel Força Tricolor, torcida organizada do Botafogo, e, diferentemente do seu perfil pessoal, na página da torcida ele consegue produzir material relacionado às ações do grupo. “Como exemplo (das iniciativas), fizemos ação na Páscoa e distribuímos cestas básicas por Ribeirão durante esse tempo de pandemia, tudo isso postado no Instagram da torcida para prestar contas com as pessoas que contribuíram financeiramente e também para tirar esse rótulo da torcida organizada de vandalismo, violência. Infelizmente, esse tipo de rotulação aqui em São Paulo ainda é muito forte”, comunicou o botafoguense.
Apesar de sentir falta do esporte pelo qual se diz devoto, o torcedor do Pantera da Mogiana não se diz favorável ao retorno dos jogos, mesmo com a crise de gestão vivida no clube e problemas econômicos enfrentados pela maioria dos times do país. Segundo ele, apesar dos protocolos de segurança, são muitos os envolvidos em uma partida, e, se a saúde de alguém pode ser prejudicada, os confrontos não devem ser realizados. “Temos que priorizar as condições das pessoas que estão envolvidas nesse ambiente do futebol e vivem dele. No aspecto de manter o elenco do time formado, seria possível permanecer sem o futebol, mas é difícil pensar só de um lado e esquecer o dos gestores e do lado financeiro do clube. No caso dos times do interior, acho que eles só vão se sujeitar a jogar por conta da situação financeira. Como disse, sou contra a volta do futebol pelo menos por enquanto”, finalizou o tricolor.
Por Arthur Ribeiro, Thiago Quint e Vitória Von Bentzeen
Redes sociais dos veículos mencionados:
Pedro Henrique Fonseca – @setorvisitante/ Setor Visitante no YouTube
Nathan dos Santos Masson – @torcidafft