Cadeira da sala de aula, laboratório de produção, Londres e Colômbia. Esse é o trajeto programado de nove alunos do Centro de Ensino Médio Integrado (CEMI) do Gama, orientados pela professora de tecnologia Eliani Conceição da Silva Ferreira. Eles vão apresentar três projetos da área de sustentabilidade. “Se não fosse por ela, a gente não teria chegado onde chegamos”, reconhece Augusto Santos, de 17 anos, um dos alunos dela.
Além de Augusto, Sthefany Luanny Oliveira, Eduardo Freitas, Wallyson Matheus, Pedro Henrique Urbieta, Bruno Lima, Giovanna Gabriela Sousa, Mayara Rodrigues e Marcelo Felipe, todos do terceiro ano do Ensino Médio, participaram da Feira Científica do Instituto MOCAM (Movimento Científico da Amazônia), que visa a incentivar a ciência e apresentar a produção científica de alunos da Educação Básica e Superior.
A ideia é estimular a criação de projetos que possam transformar a realidade social e ambiental, segundo o site do Instituto. Todos eles, após a participação na feira, ganharam credencial para levar as ideias à Colômbia e Londres no ano de 2023.
Os alunos apresentaram três projetos de sustentabilidade e meio ambiente: um ventilador de bambu, uma inteligência artificial para o reflorestamento e um relatório de conscientização do meio ambiente na pandemia da Covid-19. “Vivemos em um mundo com ar muito poluente e a gente tem que começar a respirar novos ares. Então acho que o jovem tem que começar a pensar da forma mais natural possível, pensar em novas ideias para novos artigos” relata a professora Eliani.
Os projetos
“Nossa inteligência artificial foi pensada para aplicar recursos tecnológicos com o objetivo de acelerar o processo de reflorestamento”, afirma Sthefany Luanny, de 17 anos, sobre seu projeto, que foi feito com seus colegas Pedro Henrique e Bruno. Eles pensaram em segurança, saúde e meio ambiente com foco no reflorestamento.
“O intuito é desenvolver, através da inteligência artificial, um Project que ajude a saber a intensidade do solo, quais as propriedades dele e quais as melhores plantas que se pode plantar naquele ambiente em cada região. Eles podem fazer isso de uma forma não só manual, mas futuramente, de uma forma via satélite, o que eles ainda estão estudando”, explica a professora orientadora.
Sthefany diz que ainda não consideram o projeto como concluído e que pretendem torná-lo uma realidade, passando por toda programação e regulamentação necessária até chegarem ao protótipo demonstrativo no próximo ano, quando apresentarão no “Encuentro Latinoamericano de Semilleros, Grupos y Líderes de Investigación” na Colômbia.
“O outro grupo é da Giovanna, da Mayra e do Marcelo. Eles fizeram uma pesquisa para verificar em todas as regiões do Brasil no período pandêmico quais os pontos positivos e negativos que vieram à tona com essa questão de “parou-se” tudo. Teve uma abordagem no sentido de que os carros pararam, então não teve muitos gases jogados na atmosfera, por exemplo”, relata Eliani.
Ela explica que o propósito desses alunos é trazer a consciência, através de um artigo com base em estatísticas do IBGE, de que podem ter tido pontos positivos em relação ao meio ambiente, mesmo no trágico momento da pandemia.
Sobre o ventilador de bambu, já existe um protótipo que funciona por um motor ligado a qualquer entrada USB: em carregadores de tomada, carregadores portáteis, ou conectados a um computador, por exemplo.
Um dos responsáveis, Augusto Santos, diz que o principal objetivo é a troca de material: o plástico, que demora mais de 400 anos para se decompor, pelo bambo, que demora pouco mais de um mês quando descartado.
“A idade surgiu quando a gente viu a necessidade que o Brasil e o mundo estão passando. Pesquisamos sobre o plástico e o quanto ele é poluente e danoso ao meio ambiente, e então surgiu essa ideia de fazer um ventilador com essa troca de material”, conta.
Pesquisas e testes
Eduardo, Wallyson e Augusto argumentam que, além de sustentável, o projeto ajudará pessoas de regiões muito quentes que não têm condições de ter um ventilador de plástico. Eles afirmam que o bambo é um material mais fácil de manusear e que pode ser encontrado em áreas mais carentes, distantes dos grandes centros do Brasil.
Augusto conta que o tempo de dois meses que tiveram ainda não foi suficiente para deixar o protótipo como está no esboço, já que o projeto inclui também muitas pesquisas e testes. Ainda segundo ele, durante e execução e também após a finalização pretendem levar o projeto mais adiante, para além das feiras que participaram e da próxima que receberam credencial para uma feira científica em Londres.
“Eles foram fazendo os testes e me mostrando, por exemplo, as dimensões, quantos centímetros do bambo da base e do bambo que seria elevado ou teste de resistência”, ressalta a professora. Augusto diz que essa orientação foi fundamental.
Inclusive, foi ela quem convidou os alunos para participarem da Feira do Instituto Mocam. A orientadora conta que a coordenadora de estágios do CEMI do Gama informou da oportunidade e ela, pensando no quanto gosta de lutar pela causa na natureza, convocou os estudantes.
“Precisamos fazer alguma coisa, não podemos deixar do jeito que está. Então eu senti no meu coração e na minha alma que eu precisava dar o primeiro passo”, comenta Eliani.
Assim, ela deu todas as orientações necessárias de pesquisas, testes, protótipos e apresentações e os acompanhou em todas as etapas de apresentação que já participaram: no circuito de ciências na Regional de Ensino do Gama, no Ministério da Educação e na Feira do Instituto Mocam em Porto Velho, Rondônia, onde ganharam credenciais internacionais.
“Nossa orientadora foi quem nos apresentou essa oportunidade, além de acompanhar semanalmente nosso progresso”, conta Sthefany.
“Não é só uma honra, é uma obrigação de cuidar da terra. Isso é minha grande inspiração. E poder ter essa oportunidade de passar um pouquinho do meu conhecimento para eles é melhor ainda”. Professora Eliani Conceição da Silva Ferreira
Natureza e dificuldades
Segundo dados do Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD) do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), de agosto de 2021 a julho de 2022, 10.781km2 da Floresta Amazônica foram destruídos, o que foi 3% maior que o último registro.
A professora Eliani Ferreira chama atenção para como os indígenas, além da floresta têm enfrentado muitos problemas. Eles sofrem com abusos, mortes ou garimpeiros que chegam e envenenam as águas, segundo ela. Também se preocupa com quantidade de água disponível, que tem reduzido com o passar dos anos.
“A mãe natureza está gritando e está gritando altíssimo pela viva. E se nós não tivermos água, já que somos 80% água, o que será de nós?” reflete.
“A gente vive em um momento que as pessoas não valorizam a água que bebem, o ar que respiram, uma planta ou uma árvore. Então a gente tem que plantar mais, cultivar mais, crescer mais e evoluir mais. E através disso buscar políticas públicas que possam mudar esse cenário”, diz Eliani.
Ela, que é neta de índio e bisneta de afro-brasileiro complementa: “Tenho toda uma trajetória que me faz perceber que os meus antepassados também estão gritando e pedindo para cuidar da nossa natureza que é a nossa mãe”.
O desejo dela e seus alunos agora é passar isso para o mundo através de seus projetos. Eles esperam conseguir um patrocínio que leve o projeto deles mais adiante. Para o ventilador de bambo, por exemplo, almejam encontrar uma empresa que se preocupe com sustentabilidade e que possa ajudar nos estudos e comercialização de ventiladores feitos com o novo material.
Gratidão
O sentimento que envolve os nove alunos e a professora é gratidão. Para os alunos, a felicidade do reconhecimento acadêmico. Para a professora, a sensação de dever cumprido. E para todos eles, a realização ao saber que estão ajudando a natureza.
“Eu me sinto muito feliz e muito grato, como aluno e como pessoa. Como aluno, eu tive um crescimento acadêmico muito grande, não só de abrir a mente para outras coisas, mas também durante a produção do projeto e em pesquisas, o que foi muito divertido e deu pra crescer muito como estudante”, relata Augusto Santos.
A professora Eliani almeja pela plantação de muitas novas sementes. Sementes que serão plantadas no solo e sementes que serão o futuro do país. “Essas sementinhas que eu plantei realmente brotaram. Esses meninos são o que eu plantei e eles deixarão um legado para futuro do Brasil e do mundo quando nós já estivermos velhos. E é muito bom imaginar que eu tenho uma missão pra fazer a diferença quando as pessoas não conseguem mais perceber o valor que tem a natureza”.
Por Milena Dias
Supervisão de Luiz Claudio Ferreira