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Lula terá que governar sob um estado de polarização política, dizem especialistas

A vitória do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, na eleição de 30 de outubro escancarou a divisão do País. Lula venceu com uma diferença de apenas 2 milhões de votos do opositor, o atual presidente Jair Bolsonaro, do PL.

O cenário demonstra que embora tenha vencido, Lula terá que governar em meio a uma polarização política entre defensores da democracia e da extrema-direita radical do País.

Nisso, entra uma dualidade. No discurso de vitória, Lula deixou claro que governará para um só País e que não existe separação entre os brasileiros. Na realidade, opositores à sua figura não aceitaram o resultado das urnas passivamente.

Para o jornalista e colunista político Luiz Carlos Azedo, os desafios que podem acontecer no novo governo, que começa no início de 2023, são grandes. Por isso, cabe ao chefe de Estado retomar a confiança do povo brasileiro.

“O Lula tem muita alternativa, ele tem que ampliar o governo em direção ao centro e esse avanço de centro tem custo e não é baixo. Lula comprou ‘tela em branco’ para pintar um novo Brasil”, projeta.

Azedo explica sobre a repulsão do presidente eleito, até mesmo com apoio da candidata da ex-candidata, Simone Tebet, do MDB.

“O Lula bateu na trave no primeiro turno. O PT é o Lula. E essa rejeição resulta principalmente da questão ética que foi mal resolvida. Tem uma grande parte da sociedade contra ele, contra o governo dele e uma extrema-direita golpista organizada nacionalmente que manipula também esses sentimentos”, posiciona.

Insatisfação com Bolsonaro

Em janeiro, Jair Bolsonaro se despede da presidência. No governo atual, a insatisfação popular tomou conta do mandato. Mais precisamente em junho de 2019, quando a pesquisa Ibope mostrou a taxa de crescimento de 27% para 32%. Motivo: baixo investimento em educação, aumento dos juros e imposto foram destaques para a degradação da imagem de Jair Bolsonaro.

Para o jornalista Luiz Azevedo, o aumento nos índices de rejeição do presidente Jair Bolsonaro, se justifica, entre outras razões, pela má comunicação. “O episódio com maior impacto exibido foi o da pandemia — onde o governante imitou problemas de respiração em analogia às 689 mil vítimas de covid-19”, opina.

O jornalista lembra que a majoritária parte do eleitorado na primeira eleição de Bolsonaro foi formada por profissionais em carreiras de convívio de violências como caminhoneiros e garimpeiros. “Ele (Jair Bolsonaro) conseguiu essa densidade eleitoral, porque capturou alguns sentimentos na sociedade. Uma delas é a família tradicional — com essa bandeira de Deus, pátria e família. Outra questão foi a aliança com setores pentecostais que defendem isso”, analisa.

Análise histórica

O cientista político André Rosa afirma que uma grande polarização é característica comum na política brasileira desde a redemocratização. É um fator cultural, que se repete desde PT e PSDB e, agora, no último pleito, entre Lula e Bolsonaro. André Rosa ainda chama atenção para o fato de que a maioria da população brasileira é conservadora, mas que existe um movimento que, mais do que progressista, vem de um campo Lulista, um candidato que, talvez, seja maior que o próprio partido.

Para o especialista, apesar de Lula ser o candidato que melhor consegue unir os votos de uma camada progressista da sociedade e também de pessoas que se comovem com as políticas sociais, existem fatores que puxam para o outro lado. A previamente mencionada maioria conservadora da população e os resquícios de uma ditadura militar ocorrida há menos de 40 anos, são fatores que fazem com que o comportamento político de alguns eleitores tenha um viés autoritário.

André Rosa alerta que, historicamente, sobretudo na América Latina, quando a eleição de um candidato ocorre num país muito dividido, há grandes chances de que o governante não termine o mandato. “Temos exemplos em eleições na Bolívia e, principalmente, a ex-presidente Dilma Rousseff, que travou uma eleição apertada com o opositor Aécio Neves e acabou sofrendo um impeachment”, explica.

Perguntado sobre quais desafios essa cisão apresenta ao novo governo eleito, André Rosa elenca três principais variáveis que propõem potenciais dificuldades.

“Primeiro, a opinião pública, porque uma grande parcela da população não aceita o resultado da eleição e já se identifica como oposição. Segundo, um Congresso Nacional muito voltado ao campo de centro-direita que poderá propor impeditivos à governabilidade e, por último, um poder orçamentário fortemente reduzido, sobretudo pela questão pandêmica”, menciona.

Para mitigar essas questões, o cientista político afirma que o governo precisará negociar cargos de primeiro, segundo e terceiro escalão e ampliar o número de ministérios para ampliar o apoio do parlamento.

“O presidencialismo de coalizão exige uma interlocução entre cargos e agenda, o que é ainda mais dificultado pelo fato do presidente eleito ter uma configuração parlamentar reduzida e uma grande rejeição da opinião pública”, reforça.

Já para o historiador Gabriel Carneiro, o futuro governo Lula terá de superar uma divisão social considerável. “Mais do que qualquer dificuldade pontual em realizar uma composição de governo em um momento de tamanha polarização, o futuro governo terá de superar uma divisão social considerável”, avalia.

Ele ainda fala sobre os recursos que a mídia trouxe nesse âmbito. “Trata-se de questões que transcendem o âmbito político e atingem o da moralidade, crença e valores. Além disso, a existência de mídias sociais que possibilitam a produção de informações sem um controle editorial descentralizou o principal meio de comunicação e possibilitou o compartilhamento de notícias paralelas”, comenta.

Entre tantas dificuldades, hoje o presidente eleito tem que enfrentar as pressões partidárias internas, que muitas vezes enfraquecem o governo. “O papel da conciliação está justamente em saber ceder em determinados pontos sem renunciar a seus princípios ideológicos principais. O PT sofreu justamente com essa questão durante o governo Dilma, porém Lula já se mostrou um político habilidoso e capaz de realizar  tal papel de conciliação”, reforça Gabriel Carneiro, sobre possíveis complicações.

O historiador acrescenta sobre os temas que deverão ser o foco desse novo governo.“A gestão da educação, ciência e tecnologia, os programas de vacinação, meio ambiente e cultura sofreram um desmonte considerável durante o governo Bolsonaro e precisam ser retomados com celeridade para o bom funcionamento do País”, diz.

Por: Monique Del Rosso, Pedro José, André Araujo e Henrique Fregonasse 

Fotos: Pedro José Santana

Sob supervisão de Isa Stacciarini

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