O ex-presidente do Superior Tribunal Federal, ministro Carlos Ayres Britto, considerou, em evento realizado em Brasília, que a liberdade de imprensa é um valor absoluto, inquestionável, e se posicionou de forma contrária à toda forma de regulação da mídia. No entanto, os produtores de conteúdo devem estar suscetíveis às consequências. Ele foi um dos palestrantes do 10º Fórum de Liberdade de Imprensa, da Revista Imprensa, especializada nos temas da área. Para ele, a Constituição de 1988 resguarda as ações midiáticas que são “inegociáveis”. No entanto, ele reconheceu que toda liberdade a jornalistas abre espaço para as fake news, outro tema discutido no Fórum. O termo se refere à propagação proposital de notícias falsas, com fatos irreais. Segundo o ministro, a respeito desse assunto, há muito a ser discutido. “Muita água vai rolar debaixo da ponte para esse tema chegar a um preciso equacionamento judiciário”.
Todos concordam que as fake news devem ser combatidas, mas, segundo a advogada Taís Borja Gasparian, a maior preocupação deve ser sobre projetos de leis que tentam combater essa prática. “Não se tem uma definição do que são as fake news“. Para ela, é preciso tomar cuidado porque a fiscalização pode ser medida que pretende calar a imprensa. “Quem analisa se uma matéria está completa ou incompleta? É preciso ter cautela”.
Ela também comenta que as fake news, de certo modo, ajudam a evidenciar o jornalismo de qualidade:
O jornalista Felipe Recondo concorda que, na visão do judiciário, o conceito de fake news têm sido utilizado para retirar matérias que desagradam. “Fake news virou um carimbo muito fácil e muito útil para se colocar no jornalista quando se discorda e para deslegitimar o repórter”.
Para combater a divulgação e produção de fake news, o repórter da Gazeta do Povo, Leonardo Mendes Júnior, vê que a solução é realizar uma ótima apuração. “Para combater as fake news é preciso esgotar exaustivamente a apuração e cruzar o número maior possível de fontes. O elemento novo de hoje é que a informações vem de vários lugares e a velocidade que você tem para responder aquilo”. Felipe Recondo sugere uma solução para as fake news: “A gente pára as fake news com mais notícias, mais apuração, mais matéria, mais liberdade. Você combate fake news fazendo jornalismo”.
Poder judiciário e liberdade de imprensa
A relação conturbada entre o poder Judiciário e a propagação das “fake news” também foram outros temas discutidos no fórum. Entre as principais reclamações de violência contra o jornalista brasileiro estavam medidas judiciais do poder judiciário, que se mostravam como claras tentativas de cobrir a verdade e beneficiar o próprio grupo.
Entre os exemplos de abuso judicial contra jornalista está o caso da Gazeta do Povo com a reportagem realizada em 2016 sobre o teto salarial dos juízes do Paraná. Leonardo Mendes Júnior e mais cinco colegas tiveram como condenação pela matéria viajar por 9.046 quilômetros, tantos foram os processos em diferentes regiões. Ao menos, 46 juízes não gostaram do conteúdo da reportagem, cujos dados foram obtidos nos portais de transparência governamentais. Os juízes entraram com ações no juizado especial, o qual requer a presença de ambas as partes na audiência. Cada audiência foi realizada em um local diferente do estado. Um juiz, durante uma das audiências, avisou que ainda havia 300 ações em trâmite. Os jornalistas recorreram ao STF com o intuito de parar a locomoção exagerada de uma região a outra.
“É, no mínimo, perturbador”, comenta Leonardo Mendes Júnior (Gazeta do Povo) sobre a interferência do judiciário no trabalho do jornalista.”O judiciário é onde você espera temperança, o cumprimento das lei, e nunca de usar o poder que o judiciário tem para benefício próprio ou para atacar um veículo jornalístico”.
Já para Felipe Recondo, do portal de notícias JOTA, a crítica direcionada ao judiciário é a mesma feita a todos poderes, já que todos têm tentando atacar a imprensa de alguma forma. O que ele percebe é que “o judiciário tem maior dificuldade de lidar com liberdade de imprensa com as matérias que desagradam, principalmente já que a cobertura cresceu muito com a expansão do judiciário”.
Leonardo e Felipe comentam, em entrevista, os percalços da Liberdade de Imprensa frente às retaliações de órgãos públicos:
A advogada Taís Borja Gasparian da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (ABRAJI) apontou diversas formas de calar o jornalista, uma delas é o assédio judicial, a violação de sigilo da fonte até a remoção de conteúdo.”O judiciário deveria ser o poder fiscalizador, fazer o peso e contrapeso para o bom funcionamento da democracia. Nos últimos anos, eles têm se afastado do papel que deveriam atuar e começaram a atacar a imprensa e uns aos outros”.
Violência contra a democracia
“Toda violência contra o jornalista produz um efeito triplo. O primeiro é que cessa o direito da liberdade de expressão, o segundo é que gera um impacto sobre outros jornalistas, o que provoca autocensura, e o terceiro é a eliminação coletiva da liberdade de expressão”, disse Arthur Romeo, representante do Repórteres sem Fronteiras.
Segundo o grupo, 1035 jornalistas foram assassinados em 15 anos e, neste ano, já foram confirmadas as mortes de 29 comunicadores. Entre os países que apresentam as maiores taxas de jornalistas assassinados estão a Síria, Iraque e Afeganistão. O Brasil, desde 2010, apresenta índices preocupantes, o que fez o país subir no ranking de país com menor liberdade de imprensa (de 73º para 72º de 180 países).
Os assassinatos, segundo Romeo, “são ponta do iceberg de uma cadeia de reações”. Jornalistas sendo agredidos em manifestações – tanto por forças policiais quanto por manifestantes – tiros contra sedes de empresas jornalísticas e até ataques com coquetéis molotov são algumas das violências que o grupo registrou que aconteceram no Brasil.
Além disso, jornalistas de cidades de pequeno e médio porte são os que sofrem maior risco por serem mais fácil de serem identificados. A monopolização da mídia nas mãos de poucas empresas reforça essa violência. Veja o que Romeo comenta:
Por Claudia Sigilião, Larissa Lustoza e Vitor Mendonça
Sob supervisão de Luiz Claudio Ferreira