Brasília, essa jovem senhora, chega aos 60 anos. Sonhada por JK, provocada por Toniquinho, construída por milhares de brasileiros vindos de todos os cantos do país – os candangos –, essa cidade abriu suas asas e eixos para uma multidão de gente. Uma gente sonhadora que largou tudo e se embrenhou no meio do Cerrado para fazer a vida, para lutar, para vencer. E, aos 60 anos, essa gente pode dizer, sim, que venceu, que vence, que vencerá. Brasília, inaugurada em 21 de abril de 1960, é feita de ferro e cimento, mas é feita, também, de sonhos. E de muito amor. Tanto é assim que a Agência Brasília homenageia, mais uma vez, a Capital da Esperança, com dedicadas provas de amor. A partir deste sábado (22/2) e até o aniversário da cidade, vamos reunir depoimentos de um povo que ama amar Brasília. Em meio a tesourinhas e pontes, azulejos de Athos Bulcão, o imenso céu azul, as obras de Oscar Niemeyer, o projeto de Lucio Costa, os floridos e primaveris ipês, a cor de terra durante a seca, os monumentos… em meio a tanta coisa linda, Brasília tem uma que é ainda mais linda: sua gente. E é essa gente que reunimos aqui e nos próximos 60 dias que declarará, em público, seu amor à cidade. Sim, nós te amamos, Brasília. (Freddy Charlson)
60dias para os 60 anos de Brasília
“Eu me chamo Conceição Arnídia Santana, nasci no dia 9 de outubro de 1919, completo 101 anos este ano. Nasci no pequeno distrito de Santana do Tabuleiro, município de Raul Soares, em Minas Gerais, onde meu pai tinha um sítio. Lá, morei até me casar. O marido da minha irmã veio para Brasília antes de mim, voltou para passar um tempo em Minas e contou sobre a cidade. Ele disse: ‘Cumadi, se você estivesse lá ia ganhar muito dinheiro’. Eu falei: ‘Vambora, então’. E viemos com ele. Meu marido não queria vir, mas não me deixou vir sozinha.
Naquela época, Brasília era feia demais, era puro mato, mas nós viemos com coragem. Quando vi as mulheres trabalhando felizes, pensei: ‘Ah, eu quero também’. Na roça, só os homens trabalhavam, mulher não pegava na enxada, o trabalho é muito pesado.
Trouxe meus seis filhos e arrumei mais dez de criação aqui. Vim morar na Vila Planalto, o pessoal começou a comer minha comida e gostar do meu tempero. Meu marido era carpinteiro e vigilante e começou a trabalhar na construção de Brasília. Eu montei uma cantina que também funcionava como pensão. A casa tinha uns 50 cômodos e muita gente dormia lá porque não tinha onde dormir nos acampamentos.
Naquela época, Brasília era feia demais, era puro mato, mas nós viemos com coragem. Quando vi as mulheres trabalhando felizes, pensei: ‘Ah, eu quero também’. Na roça, só os homens trabalhavam, mulher não pegava na enxada, o trabalho é muito pesado.Conceição Arnídia, 100 anos
Eu dei minha cama muitas vezes para as mães dormirem com crianças para não ficarem no chão. Além da pensão, eu montava uma cantina dentro dos canteiros de obra. De uma obra ia para outra. Trouxe oito cozinheiras de Minas para me ajudar. Forneci alimentação para os trabalhadores do Congresso Nacional, alguns ministérios, o Hospital Regional da Asa Norte, a Caixa Econômica da 509 Norte…
Com o dinheiro que ganhei, comprei lotes em Taguatinga, onde construí minha casa e me mudei em 1996 para trabalhar na construção do batalhão da Polícia Militar aqui na QNG. Depois não trabalhei mais. Gosto de viajar, mas gosto de voltar para minha casa.
Até hoje gosto de casa cheia, não sei ficar sozinha. Tenho 26 netos, 33 bisnetos e 17 tataranetos. Quando eu fiz 100 anos eles fizeram uma festa para mim que reuniu 300 pessoas e não deu para convidar todo mundo. Eu adoro Brasília, aqui é minha terra. Agradeço a Deus por todas as graças que ganhei aqui, plantei muito para meus filhos e netos colherem. Mas agora eles que cuidam de mim. Já cozinhei muito e muito bem, mas hoje gosto é de comer.”
Conceição Arnídia Santana, 100 anos, aposentada, mora em Taguatinga
- Depoimento colhido pela jornalista Gizella Rodrigues