Apesar do Brasil ter a maior reserva de água doce do mundo, várias cidades brasileiras já enfrentam problemas de estiagem e falta d´água. E o uso da água para abastecimento humano nas cidades brasileiras deve aumentar em 10,5% até o ano de 2040, aponta o estudo Manual de Usos Consecutivos da Água no Brasil, elaborado pela Agência Nacional das Águas (ANA), o que acende o alerta para a importância do uso consciente. Este aumento, aponta o estudo, que nas décadas anteriores cresceu muito por causa da concentração da população nas cidades, nos próximos anos deve ser afetado por mudanças nos sistemas de abastecimento e pelo padrão de consumo das famílias.
Em Goiânia, o consumo para abastecimento humano nas cidades é de 13,3 milhões de litros por segundo, de acordo com a ANA. Apesar de não estar entre as 10 capitais com maior índice, a cidade já vem fazendo seu dever de casa e apresentando iniciativas para despertar uma nova cultura na população quanto ao reúso da água. O Órion Complex, empreendimento que abriga mais de 300 clínicas, hospital, um hotel, um shopping e recebe cerca de 5 mil pessoas por dia, foi entregue com um sistema para reaproveitamento tanto das águas das chuvas quanto dos drenos do ar condicionado. Esse último sistema foi pioneiro no Estado.
Com operações iniciadas em 2019, a iniciativa surgiu muito antes da regulamentação da prática, que em 2023 ganhou uma lei federal, Lei 14.546/23, na qual o governo federal deve estimular o uso de água das chuvas e o reaproveitamento não potável das águas cinzas em novas edificações e em atividades paisagísticas, agrícolas, florestais e industriais. O estudo Conjuntura dos Recursos Hídricos no Brasil, de 2018, estima que o reaproveitamento de água não potável chega a 2m³/s. A meta proposta pelo governo federal é que o reúso não potável direto no país alcance 13 m³/s até 2030.
“Este sistema permite que façamos o reúso de água para limpeza e manutenção de paisagismo, diminuindo assim o uso de água potável da concessionária”, explica o engenheiro Leopoldo Gouthier de Oliveira, síndico do complexo que também acompanhou a construção do empreendimento. Ele lembra que, além do uso consciente, o reúso também gera economia. Considerando os dois sistemas, eles podem suprir de 15% da necessidade total de água do complexo, dependendo da estação do ano.
Como funciona
O edifício possui dois reservatórios. O primeiro, com 35.700 mil litros, está instalado no sétimo andar e recebe a água reutilizável, que vem tanto dos drenos do ar condicionado quanto da chuva, que vem das calhas instaladas na cobertura, e dreno do sistema de incêndio. Neste local, passa por filtros para retirar as impurezas.
Atualmente, ela recebe cerca de 20 mil litros por dia vindas dos drenos de ar condicionado, em média. Quando é tempo de chuva, a maior parte vem das calhas; quando chega a estação da seca, a reserva é formada com o aumento do uso do ar condicionado, que normalmente é intensificado. Depois do tratamento, ela segue por uma tubulação própria para ser reaproveitada na limpeza do prédio e para aguar as plantas. “Só a irrigação de jardins no Órion consome cerca de 35 m³ por dia”, informa o síndico do complexo.
O excedente da água, que normalmente acontece no período chuvoso, é conduzido para um segundo tanque de 16.800 litros, situado no quinto andar. Ele é responsável por reduzir a velocidade com que a água desce para chegar a um terceiro tanque, o de infiltração que está instalado no subsolo. Neste tanque, parte da água vai para o lençol freático e o excedente é destinado para as galerias pluviais, o que acontece somente após a chuva ter passado, devido ao tempo para encher cada compartimento.
“Além evitar que um grande volume de água chegue de forma abrupta nas galerias pluviais da cidade, quando os tanque ficam cheios, com água sobrando, o volume excedente é direcionado para o chamado tanque de infiltração, que faz com que a água chegue lentamente ao lençol freático”, detalha Leopoldo Gouthier. Essa redução de velocidade é uma das medidas para se evitar que rios transbordem nas metrópoles.