Em homenagem à capital federal, formada por gente de todos os cantos, a Agência Brasília está publicando, diariamente, até 21 de abril, depoimentos de pessoas que declaram seu amor à cidade.
“Hoje, quando eu olho para trás, vejo como a gastronomia ajudou no crescimento de Brasília. Quando eu abri o restaurante, em 1988, só tínhamos o básico. Os restaurantes fechavam no fim de dezembro, janeiro e fevereiro. Abriam quando o Congresso Nacional voltava de recesso. Não tinha ninguém em Brasília.
O Ceasa era um empório de secos e molhados e, gradativamente, começamos a pedir e os comerciantes começaram a trazer de São Paulo salsão, alho-poró, erva-doce, tomilho, sálvia, brócolis… Não tinha alface americana aqui na época, por exemplo. E os japoneses rapidamente começaram a produzir essas coisas que não tinha em Brasília, acho que em um ano estavam produzindo.
Atualmente se acha tudo aqui. Me sinto feliz de poder, no sábado, me levantar às 5h e ir pro Ceasa. Tudo que eu preciso eu encontro lá, não trago mais nada de fora, só o que é importado. O que é produzível no Brasil se produz em Brasília e com ótima qualidade. É impressionante a mudança que aconteceu nesses 30 anos.
O Ceasa prestou grande serviço nesse sentido. A pedido dos donos de restaurantes, ampliou rapidamente o parque de frutas e legumes. Mais tarde veio a agricultura orgânica. O Ceasa foi o grande vetor de transformação e da melhoria da gastronomia de Brasília. A Embrapa, também.
No final dos anos 90, a Embrapa desenvolveu um tomate chamado san marzano, que é o típico tomate de Nápoles, aquele tomate comprido, doce. E entregou para os produtores do Pipiripau, mas a Embrapa esqueceu que deveria haver mercado, para onde iam levar?
Morar em Brasília é bom. Tudo que tem em São Paulo e no Brasil inteiro temos aqui. Brasília é a grande vitrine nacional, todo mundo quer ver aqui o produto do seu estado e da sua região. Hoje você tem em Brasília restaurantes de todas as regiões e todas as etnias.
Na época, os produtores precisavam vender a caixa do tomate a R$ 12 para ter algum retorno – custava quase R$ 10 para eles produzirem. E a turma vendia o tomate normal a R$ 5. Ninguém queria comprar. Então, reunimos um grupo de cinco, seis donos de restaurante, íamos lá buscar o tomate e pagávamos R$ 12 para eles continuarem plantando. Em três anos vencemos a guerra, eles foram aos poucos colocando nas feiras, no Ceasa e a turma viu que o tomate era diferente.
Moro em Brasília desde 1987. Sou do sul de Santa Catarina, mas morei no sudoeste do Paraná, sul do Mato Grosso, sul de Rondônia e Porto Velho. Eu ia voltando para o Sul e parei em Brasília (trabalhava na época para o Ministério do Interior e recebi um convite para vir trabalhar aqui).
Minha ideia era voltar para Santa Catarina em menos de um ano e continuar minha carreira de professor universitário, mas minhas duas filhas mais velhas – uma tinha 12 para 13, a outra 13 para 14 –, disseram: ‘mas toda vez que a gente faz um grupo de amigos vocês se mudam’. Aí dona Carmélia e eu começamos a pensar nisso e decidimos ficar.
Aí, surgiu uma oportunidade e abrimos o restaurante, profissionalizamos meu hobby. Tinha o hobby de cozinhar desde os 11, 12 anos. Eu fazia o frango da família em casa nas refeições de domingo e, aqui, os amigos me chamaram atenção elogiando minha comida. Na minha história, eu tinha aprendido a fazer três pratos importantes que até hoje são nosso carro-chefe. Quando eu morei no Sul aprendi a assar carne. Na adolescência morei em São Paulo e aprendi a fazer bacalhau com os portugueses transmontanos. Quando morei na Amazônia aprendi a trabalhar com tambaqui e pirarucu.
Assim, fui montando minhas próprias receitas e resolvi fazer o restaurante basicamente com esses três pratos. Era salada de entrada, que fiz em homenagem ao meu pai (para ele não havia refeição sem salada) e picanha, bacalhau ou tambaqui. A sobremesa era o mousse de chocolate da dona Carmélia, que ela fazia nas refeições de família.
Moro na 304 Sul, moro na Asa Sul desde que me mudei para cá. Brasília já foi muito melhor de se morar. Como todo o Brasil, sofreu uma depreciação da qualidade de vida. Mas, com certeza, ainda é um dos melhores lugares do Brasil para se viver. Morar em Brasília é bom. Tudo que tem em São Paulo e no Brasil inteiro temos aqui. Brasília é a grande vitrine nacional, todo mundo quer ver aqui o produto do seu estado e da sua região. Hoje você tem em Brasília restaurantes de todas as regiões e todas as etnias. Tudo que você quer de restaurante você tem em Brasília e com qualidade.”
Francisco Ansiliero, 80 anos, chefe de cozinha, mora na Asa Sul
- Depoimento concedido à jornalista Gizella Rodrigues