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Imigrantes refugiados recomeçam a vida em Brasília com trabalho e assistência

O Distrito Federal é uma das unidades da federação que mais recebe imigrantes no Brasil. De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), 13 mil estrangeiros moravam no DF em 2015, sendo que 7.789 trabalhavam em setores não agrícolas da região. A maioria dos estrangeiros são dos Estados Unidos, Reino Unido, Espanha, Argentina e Japão. A estatística é do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2010.

Ao chegar no país, muitos deles sofrem com o desemprego e a falta de amparo, além de adversidades como as diferenças culturais e da língua. Goran Dislioski, imigrante da Sérvia, afirmou que uma das maiores dificuldades que encontrou no país foi a diferença na hora de falar. Ele está em Brasília há quase cinco anos.

 “Quando você chega não fala muito bem, mas pega o idioma muito rápido porque as pessoas tentam ajudar, com mímicas ou com gestos”, comentou. Goran abriu uma hamburgueria com comidas típicas do país dele. A ideia surgiu da junção da saudade da comida e do desemprego. Por isso, ele comprou um foodtruck e criou a marca Belgrado Burger.

Logo depois, conseguiu ter um espaço fixo e utiliza uma loja na 107 Norte. Ele ressaltou, ainda, as similaridades entre Brasil e Sérvia e disse que ambos são países abertos com pessoas comunicativas. “O pessoal (no Brasil) é bem social, sempre que tinha dificuldades em falar a língua, eles me ajudavam.”

Chance de trabalho

Dados recentes do Observatório das Migrações Internacionais (OBMigra), consórcio firmado entre a Universidade de Brasília (UnB) e o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) mostram que o número de trabalhadores imigrantes formalmente empregados no Brasil passou de 94.688 em 2012 para 120.056 imigrantes em 2013, um crescimento de 26,8%.

Franyer José, 25 anos, é venezuelano e faz parte dessa estatística. Há cinco meses mora no DF e, atualmente, trabalha como caixa em um restaurante no Setor Comercial Sul. Quando chegou ao Brasil, foi amparado pela ONG Fraternidade Sem Fronteiras (FSF), que tem a sede localizada em Boa Vista (Roraima). A organização ajudou o estrangeiro a ser transferido para Brasília, com o objetivo de regularizar os documentos de imigração e conseguir um emprego.

Ele conta que a busca por trabalho foi o que o motivou a mudar da Venezuela para, assim, conseguir ajudar financeiramente a família que ainda mora no país. “Mudei da minha nação de origem pela crise humanitária que estava ocorrendo lá. A escassez de alimentos, de remédios e a falta de segurança são os principais problemas”, acrescentou.

Franyer revelou que escolheu morar no Brasil porque é uma nação receptiva e que oferece os suportes necessários para a entrada e o acolhimento de imigrantes. “O Brasil abre muitas portas para os estrangeiros. Todos nós somos muito bem amparados aqui”, ressaltou. Para ele, as principais dificuldades como imigrante são a língua, o trabalho e a discriminação sofrida por ser estrangeiro.

Apesar de conviver bem com os brasileiros que o cerca, o imigrante já foi alvo de  preconceito. Um desses episódios ocorreu em uma entrevista de emprego, logo quando chegou ao Brasil. “Uma das pessoas que estava lá para a entrevista de trabalho me disse que não seria contratado só porque sou venezuelano”, contou.

Voluntários

A ONG Fraternidade Sem Fronteiras (FSF) ajuda diversos setores no Brasil. Com a crise na Venezuela, começou a prestar assistência a imigrantes venezuelanos que chegavam em Roraima para iniciar uma nova vida no país. O centro Brasil um coração que Acolhe é o primeiro de acolhimento da FSF no Brasil. Os voluntários que quiserem podem ajudar o projeto com doação de dinheiro ou apadrinhamento de algum imigrante para auxiliá-lo na adaptação na cidade.

Pedro Onofre, 46 anos, é voluntário da ONG e padrinho de imigrantes. Desde que entrou no projeto, já acolheu uma família e dois jovens, um de 19 e outro de 25, aqui em Brasília. “Muitos desses imigrantes vêm para o Brasil com apenas a roupa do corpo, passando fome, com o psicológico abalado e financeiramente precarizados”, ressaltou.

Até hoje, todos os venezuelanos que Pedro ajudou foram trabalhar na indústria de alimentos que ele é proprietário. O empresário contou que a função do padrinho na ONG, basicamente, é a de conseguir um emprego para o estrangeiro, podendo ser em qualquer lugar do mundo. Por sua vez, a questão da garantia de hospedagem depende da disponibilidade de cada um.

Voluntária da ONG Fraternidade Sem Fronteiras brincando com crianças no Malawi. Foto: ONG Fraternidade sem Fronteiras/Divulgação

A bancária Tieta Avelar também é voluntária na ONG. Conheceu o projeto em fevereiro de 2016, mas foi em 2017 que o chamado ao coração pulsou mais forte. “Foi depois disso que me cadastrei para ser madrinha. Ainda em 2017, em uma das várias caravanas realizadas pela organização, fui até Moçambique conhecer o projeto mantido pela ONG em aldeias naquele país. Sou voluntária desde então”, revelou. Atualmente, além de voluntária e caravaneira, é representante regional da ONG no Distrito Federal.

Arte: Gabriela Zimovski

Movimento imigratório

Para a historiadora Rebeca Mylena Gouveia, o movimento imigratório dos últimos 10 anos está muito associado à crise do século que se vive hoje. Segundo ela, a imigração sempre foi uma realidade, mas, desde 2008, o fluxo de imigrantes tem aumentado, porque muitos deles fogem de guerras, conflitos, fome, calamidades e outros problemas no país de origem. “Não tem como analisar o movimento imigratório sem falar da crise do século XXI, uma crise de paradigmas políticos e culturais”, completou.

Ela acredita que o Brasil é um país capacitado para receber estrangeiros refugiados, porém, ainda deixa a desejar com relação a gerência dos recursos disponíveis.  “A questão dos imigrantes, principalmente dos venezuelanos, deveria ser um instrumento de mudança para fazer as coisas acontecerem de verdade no país. Precisamos abrir os olhos para essa realidade”, declarou.

Apesar do Brasil ser conhecido como um país receptivo e acolhedor, muitos casos de xenofobia ainda são registrados. Segundo Rebeca, isso se dá pelo fato dos estereótipos que não condizem com a realidade, criados pelos brasileiros. “Boa parte das pessoas ainda acreditam que os imigrantes são uma ameaça para o desenvolvimento do país e que é preciso lidar com eles de uma forma fria e calculista”, revelou.  

Nova Lei de Imigração

Arte: Carolina Monteiro

Em 24 de maio de 2017, foi sancionada a nova Lei de Migração que substituiu o antigo Estatuto do Estrangeiro de 1980, época em que o Brasil ainda passava pelo regime militarDiferente da antiga lei, que adotava uma postura de segurança nacional e de criminalização do imigrante, as políticas da norma atual defende os direitos e os deveres do imigrante e do visitante, além de regular a entrada e a estadia no país.

A norma trata o movimento imigratório como um direito humano e prevê o combate a xenofobia e a discriminação contra o imigrante.  O processo de obtenção de documentos para legalizar a permanência do imigrante no Brasil, bem como o acesso ao mercado de trabalho regular e serviços públicos, também se tornou menos burocrático. Além disso, os estrangeiros não podem ser mais presos por estarem de modo irregular no país e são livres para se manifestar politicamente, inclusive com a possibilidade de se associar a reuniões políticas e sindicatos.

O Brasil é uma das únicas nações do mundo que amplia os direitos dos imigrantes e facilita o processo para que eles regularizem sua situação. Por causa disso, a  nova lei de imigração é vista com bons olhos por organizações internacionais. Países europeus e os Estados Unidos, por exemplo, são movidos por um ideário nacionalista e fecham as fronteiras, aumentando as restrições quanto ao estrangeiros.

Camilla Lopes, Carolina Monteiro e Gabriela Zimovski

Sob supervisão de Isa Staciarini