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Orédio Alves de Rezende, pioneiro das autopeças no DF

Parecia um domingo de sol como outro qualquer, quando o empresário Orédio Alves de Rezende decidiu levar a família para um piquenique ali nos arredores do Aeroporto Internacional de Brasília.

Era final dos anos 1960 e o lugar era ermo, como quase toda a cidade na época. “A estrada que ia para o aeroporto passava pela Velhacap, hoje, Candangolândia”, lembra o pioneiro.

De repente, um susto. Estaciona atrás de seu DKW-Vemaguet cinza um carro preto. “Era o presidente Juscelino Kubitschek, que ia para o aeroporto pegar um avião. Só ele e o motorista. Desceu do carro, deu um beijinho nas crianças, pegou um pedaço de qualquer coisa para comer e foi embora”, recorda. “Nessa história pouca gente acredita”, ri.

Goiano de Pires do Rio, Orédio Alves, hoje com 83 anos, é daqueles desbravadores que chegaram a Brasília quando a cidade era um enorme canteiro de obras. Ou seja, bem antes da inauguração da nova capital, em 21 de abril de 1960.

Havia poeira espalhada por toda a cidade – um verdadeiro manto vermelho estendido no horizonte. A vinda foi em 1957, para a Cidade Livre, hoje Núcleo Bandeirante, com a missão de instalar na Segunda Avenida, nº 970, a filial da Induspina Autopeças, primeira unidade da empresa fora de Goiás e a primeira loja do ramo no Distrito Federal.

Pioneira no ramo de peças de veículos, a Induspina abriu a primeira loja no Núcleo Bandeirante | Foto: Arquivo pessoal

O terreno foi cedido, pessoalmente, por Bernardo Sayão, engenheiro da equipe do arquiteto Oscar Niemeyer e do urbanista Lucio Costa – responsáveis pela idealização e construção de Brasília.

“As pessoas achavam que eu estava doido ao vir para cá sozinho. Quando cheguei, camarada, aqui era tudo isolado, não tinha ninguém conhecido, só barulho de máquina dia e noite”, conta.

“Eu vim para Brasília por causa do Bernardo Sayão, ele era sogro de um dos Pina, família que dominava Goiás na época, e da qual meu patrão fazia parte. Um dia, ouvi uma conversa deles assim: ‘se vocês, que são goianos, não se interessam por lá [Brasília], quem vai se interessar? Vocês têm que abrir uma loja lá’”. Sugestão dada, seu Orédio assentiu e seguiu as dicas.

Filme O Legado de um Pioneiro, disponível apenas no Youtube, conta a história do pioneiro Orédio Alves de Rezende | Foto: Reprodução

Homenageado em novembro deste ano com o título de Cidadão Honorário de Brasília, concedido pela Câmara Legislativa do DF, o empresário teve sua trajetória transformada em filme. Com duração de 60 minutos, O Legado de um Pioneiro – disponível apenas no Youtube -, é mais do que o resgate de uma vida, é a evidência dos princípios de um homem cujo maior prazer sempre foi trabalhar.

“A primeira ideia era escrever um livro, mas o filme se tornou um projeto mais viável”, conta o produtor e roteirista Flávio Resende, filho de Orédio. “É a história de um homem que dedicou a vida ao trabalho, os seus valores. Sua trajetória é uma inspiração para as novas gerações”, avalia.

Referência no mercado

A Induspina tem até hoje uma loja na W3 Sul | Foto: Lúcio Bernardo Jr / Agência Brasília

Graças ao esforço do pioneiro, a Induspina Autopeças, uma das raras empresas nascidas antes da inauguração da cidade –  ainda em atividade – , se tornaria, em pouco tempo, uma referência no segmento.

Sobretudo porque disputava a concorrência no mercado local com uma única empresa, a Peças Moreira. Com o sucesso do negócio, veio a expansão. O lugar escolhido para a nova sede seria a 514 na W3 Sul.

Naquele ano de 1960, mesmo com a inauguração da cidade, poucos lojistas se arriscavam a ter um empreendimento na rua comercial mais popular do DF – W3. Existiam apenas a Bibabô, loja de departamentos, o restaurante Roma e a Pioneira da Borracha, essas duas ainda em funcionamento.

O empresário Orédio: “Gosto muito de Brasília, vi essa cidade crescer” | Foto: Lúcio Bernardo Jr / Agência Brasília

“Todas as empreiteiras que trabalharam na construção de Brasília eram cadastradas na Induspina. O que eu tinha de peça, vendia, porque não tinha onde comprar, e as máquinas e caminhões trabalhavam dia e noite. Com isso, a empresa foi ficando muito popular, muito benquista”, explica.

“Eu nunca deixei de atender uma pessoa que batesse na minha porta. Podia ser qualquer hora da noite ou da madrugada”, lembra, orgulhoso.

Assim, trabalhando de sol a sol, um belo dia de 1964, Orédio aceitou abrir sociedade e expandiu os negócios, totalizando, até o final dos anos 1980, cinco filiais: Núcleo Bandeirante, Asa Sul, Taguatinga Centro, SIA e Asa Norte, congregando 80 funcionários. Hoje, há apenas uma loja, na W3 Sul, com 11 empregados.

“Tudo o que sei eu aprendi com o seu Orédio”, se emociona Ronaldo Leite, que trabalha há mais de 20 anos na empresa.

A carteirinha de pioneiro de Brasília | Foto: reprodução

 “Gosto muito de Brasília, vi essa cidade crescer”, afirma o empresário, que faz questão de exibir a carteirinha da Associação dos Candangos Pioneiros de Brasília.

Afastado da empresa por motivo de saúde, ele dedica seu tempo, há mais de 20 anos, à fazenda Santa Rosa, a 78 km de Brasília. “Eu sou filho de fazendeiro, trabalhei na roça”, conta.

Orédio lembra ainda que, no fim dos anos 1970, quase início da década seguinte,  foi considerado o maior produtor de gado Gir (raça originária do Norte da Índia)da região. “Participei de tudo quanto é exposição, tenho a parede forrada de taças que ganhei com o meu gado”, revela.

LÚCIO FLÁVIO, DA AGÊNCIA BRASÍLIA