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Professores do sistema prisional do DF e de PE evidenciam a batalha diária para dar uma nova oportunidade de vida aos detentos. Em ambientes de ressocialização, o desafio é com menores de idade. Os docentes dizem que é preciso respirar Paulo Freire

Em um país, como o Brasil, que ocupa o 3º lugar de maior população carcerária do mundo, com exatos 753.966 mil presos, a chance de ter uma nova oportunidade de vida é a possibilidade que essas pessoas terão de não se entregarem de novo ao crime.

Um caminho para essa reviravolta na vida desses indivíduos seria pela educação e novas capacitações. “Eu acredito que a educação pode mudar as vidas dessas pessoas”, diz Maria Sônia Vieira, professora de português que leciona há quase dez anos dentro dos presídios do Distrito Federal.

Os presídios não suportam a imensa população carcerária brasileira, há um déficit de vagas nas prisões de 255.286, de acordo com os dados do primeiro semestre de 2020 do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (InfoPen), ou seja, mais de um terço dos detentos estão sem vaga.

Segundo o InfoPen, dos 750 mil presos em todo o Brasil, apenas 92 mil, 12,5% participam de atividades educacionais, incluindo escolas, ensino superior, cursos profissionalizantes, atividades complementares e outros. Existem 1.507 presídios ativos no país, mas nem todos possuem escolas.

No caso do Distrito Federal, dos 16.048 presos, 3.381 participam de atividades educativas, 21,07%. O DF ocupa a quarta posição de presos no ensino por população carcerária. São 248 alfabetizandos, 729 no ensino fundamental, 302 no médio, 16 no ensino superior, 415 participando de atividades complementares, 114 em cursos profissionalizantes como auxiliar administrativo e 1.557 recebendo remição pelo estudo e esporte. 

 

Professores Artistas

“A educação tem que ser libertadora”, professora Sônia.

“Os professores são artistas”, diz Maria Sônia Vieira em relação aos professores que trabalham nos presídios. “Sempre estamos inventando algo novo, nos desdobrando para entreter e chamar mais gente para o ensino”, complementa a professora que já trabalhou em quase todos os centros de detenção e nas penitenciárias do DF, masculina e feminina.

Antes da pandemia começar, a professora conta que existia o “Festarte”, um evento de criatividade e arte. “É um festival que nasceu para envolver a comunidade carcerária, então tinha artesanato, poesia, dança, teatro e pintura”. Nesses eventos todos podiam participar. Além desse festival, há outras formas de chamar atenção para o ensino como os grupos de leitura, de poesia, redação, teatro e outros. “São pequenas pílulas pedagógicas que a gente usa para tentar motivá-los”.

Em 2018, os professores também tiveram uma ideia de um jornal para a comunidade. “No ano passado, veio a pandemia e este ano a gente pegou essa ideia e estamos transformando em uma revista de cunho educativo. A gente quer trazer uma linguagem científica, artística, humana para envolver quem vai ler. Para isso, estamos buscando o que eles gostariam de ler e o que eles precisam ler”.

O volume um da revista já foi lançado, no começo de 2021 e o tema foi sobre a pandemia. “Todos os materiais que produzimos são voltados para o contexto social que a gente vive, social, econômico, o contexto da pandemia. Eles ficam isolados de tudo então as notícias que realmente chegam, vem por meio da escola”.

Desde o começo da pandemia, as aulas presenciais no ensino prisional ficaram suspensas. Os professores tiveram que inovar no método de dar aula, pois não podiam fazer on-line porque não havia acesso à internet, além da falta de estrutura. “Pensamos em dar às aulas no formato de rádio, como um programa em uma AM, mas o projeto não foi para frente”, diz a professora.

A forma que eles encontraram de ensinar remotamente pulando os obstáculos foi através de apostilas, ensino mediado por material impresso. “É muito difícil você ofertar um ensino de qualidade sem a presença do professor. O professor funciona não só como mediador do conhecimento, mas também como aquela pessoa que motiva, que impulsiona e resgata a identidade humana dessas pessoas”.

Avatares

Esses cadernos de estudos foram feitos de forma diferente, e isso é fundamental no processo, “o pulo do gato”, de acordo com a professora. O material foi produzido para esse público. Para ajudar, cada professor fez o seu próprio avatar para promover o diálogo com os estudantes mesmo distantes.

Os avatares iam acompanhando o ensino do aluno durante toda a atividade. “O aluno tem a necessidade da presença do professor conversando com ele. Então, a gente usa balõezinhos mostrando o avatar do professor conversando com o aluno, apresentando o conteúdo, tirando uma dúvida que a gente tenta prever”. Os professores também colocaram caixas para os alunos escreverem como estão, o que tão sentindo, se há alguma dúvida no conteúdo e se conseguiram aprender.

“A ideia é tentar trazer aquele universo daquele jovem ou adulto que a gente está atendendo para a realidade de uma escola para mostrar que é possível sim!”, manifesta Sônia.

 

Diálogo

“Quando o ensino é voltado para o adulto, o primeiro teórico que a gente pensa é Paulo Freire porque ele realmente vem do chão da escola. E para trabalhar esse público diferenciado é necessário entrar no universo deles, ver o que faz parte da vida daquelas pessoas para que a educação seja significativa, e isso acontece através do dialogismo abordado por Paulo Freire”, explica a professora.

O dialogismo de Freire afirma que o educador precisa partir do interesse do educando. “O diálogo só existe quando aceitamos que o outro é diferente e pode nos dizer algo que não conhecemos”, assim diz Freire. Essa prática ajuda a estabelecer ações que permitam a participação do outro no processo de ensino.

“Isso dentro do sistema prisional é a chave porque a maioria das pessoas que ali estão, tiveram problemas ao longo da sua vida educacional. A maioria viveu algum tipo de fracasso, dificuldade, que fizeram com que ela abandonasse o estudo. Então quando você resgata aquela pessoa dentro do cárcere ela precisa ser tocada porque ela chega fragilizada, o ensino que a gente vai ofertar tem que ser significativo na vida dela para ela ver que ainda há uma chance”.

Para Sônia Vieira, dar aula nos presídios, tanto masculino quanto feminino, não é uma questão de coragem, como muitos pensam, mas sim de objetivo. “A educação é libertadora e por isso, precisamos trabalhar nossos preconceitos, superar e cicatrizar nossas dores para dar uma oportunidade a essas pessoas para que elas também consigam fazer escolhas melhores na vida dela”.

 

Autoestima

“O erro não pode ser maior que o homem”.

A frase dita pelo Padre André Albert Coopman virou um hino recorrente na escola que carrega o seu nome. Situada no presídio Dr. Rorenildo da Rocha Leão, no município de Palmares, na região da mata-sul do estado de Pernambuco. “O erro não é maior que o homem e a gente está mostrando isso com o nosso trabalho, a gente tem conseguido mostrar um outro lado”, diz Emanuel Luís, professor de português e inglês da escola. 

O presídio tem capacidade para 74 presos, mas tem mais de 800 vivendo de forma precária e sem dignidade. “A gente tem alunos que vão para escola com sequer um chinelo”, diz a gestora da escola, professora Cláudia Siqueira.

Os presídios de Pernambuco possuem 32.960 presos e 26,03% desse quantitativo participam de atividades educacionais. São mais de quatro mil detentos no ensino fundamental, 1.300 no ensino médio e 980 na alfabetização. Há também alunos no ensino superior, cursos profissionalizantes e atividades complementares. Das 23 unidades prisionais pernambucanas, 21 delas têm escolas e bibliotecas.

A atividade educacional no presídio do município de Palmares é superior a 80%. Os professores trabalham favorecendo a autoestima dos alunos, e esse trabalho em muitos dos casos começa pelo diálogo.

-Olha, não é o fim. Você não está no fundo do poço. Vamos virar essa página juntos!

“Essa maneira de se direcionar a esses reeducandos têm feito com que a escola se torne realidade deles, não uma luz no fim do túnel, mas a luz do fim do túnel”, explica o professor Emanuel.

A escola Padre André possui atividades extras que também motivam esses reeducandos a se manterem na escola, como o coral “Cristo é a Paz”, que é composto pelos alunos. Esse coral se apresenta para todas as visitas que o presídio e a escola recebem, “isso é algo que eleva muito a autoestima deles porque eles são vistos como autoridades. Inclusive eles fizeram algo inédito, em 2019, uma reunião no Recife com o governador e toda a cúpula de segurança do Estado, houve uma abertura do evento e eles que fizeram a abertura, por mais contraditório que seja foram esses detentos que deram um show”, diz a professora Cláudia Siqueira.

A escola também tem um curso de inglês, teatro, cursos técnicos que até o momento são dois, Curso ead em segurança do trabalho e administração. “E quem conclui o ensino médio tem direito a uma formatura de graduação, que é para valorizá-los pelos seus feitos, pela conquista e essa formatura também é algo que motiva muito eles”, complementa a professora.

Todas as escolas prisionais do estado de Pernambuco também possuem o Trabalho de Conclusão do Ensino Fundamental (TCF). Quando esses alunos concluem o ensino fundamental, eles fazem um trabalho de conclusão de curso. É um trabalho de pesquisa, com direito a orientador e banca para apresentação da pesquisa. “Quando esse projeto surgiu, os gestores das escolas prisionais ficaram preocupados pois a gente não tem o acesso a internet, a gente não tem o acervo necessário para essa pesquisa. Para a surpresa de todo mundo, os trabalhos das escolas prisionais foram os melhores do estado”, diz Silvana de Fatima, chefe da Unidade de Educação em Prisões do Pernambuco.

“Muitas vezes o incentivo financeiro é pequeno para organizar esses projetos como o TCF. Então a escola assume esse filho nesse momento e dá o seu melhor”.

Além desses cursos, o professor Emanuel anunciou que a escola futuramente terá seus primeiros escritores da escola. “Já temos um cordelista e um aluno que está escrevendo um livro”.

“Eu era um nada”

“-Professor quando eu cheguei aqui eu era um nada. Professor quando eu cheguei nessa escola eu senti um negócio diferente, eu olho nos olhos de vocês e vejo verdade. Eu sempre vivi de mentira, do crime, mas quando o senhor aperta minha mão o senhor está dizendo assim: vale a pena ser melhor”

O depoimento do futuro escritor para o professor.

O método que a escola utiliza para ensinar é o socioconstrutivismo, onde um aluno aprende com o outro. “O ensino está entre eles e apoiando um ao outro. Isso vai tornando a escola atrativa e promove o resgate da autoestima”, afirma o professor.

Paulo Freire dizia que a educação transforma pessoas e as pessoas que transformam a sociedade. Os professores dessas escolas não só pensam nesse ensinamento como carregam essa prática para o dia a dia das aulas. “Temos relatos de ex-alunos agradecendo a escola e dizendo que a partir da escola eles não voltariam mais para o crime que seriam pessoas diferentes, porque a escola resgatou nele a dignidade e o desejo de ser uma pessoa melhor”, manifesta a professora. 

Na pandemia, a escola Padre André, como qualquer outra escola, teve que se inovar no método de ensino. “Na realidade se foi o desafio para o pessoal aí fora se reinventar pra gente foi o tripo”, diz Emanuel. As escolas prisionais pernambucanas trabalharam na forma de entrega de atividades em parceria com a Secretaria de Ressocialização do Estado. 

As atividades eram distribuídas para os alunos do presídio, e os professores utilizavam caixinhas para se comunicar com o aluno, pois era o único do educando e educador manterem contato. Geralmente dentro dessas caixas havia perguntas, como se ele entendeu, se conseguiu fazer a atividade de forma fácil, se há alguma coisa que ele faltou entender. “Era uma comunicação pombo-correio. Entrega a atividade, depois recebe, lê e entrega de novo”.

 

Virtual e real

Posteriormente, a escola Padre André conseguiu desenvolver a aula remota, porém as aulas não eram ministradas na escola pois ela estava cedida para o isolamento dos casos de covid. “A gente pediu para a direção do presídio nos ceder um espaço para a aula, e o espaço que eles nos deram foi um corredor entre os pavilhões, então a gente trabalhou literalmente no espaço deles”, disse Cláudia. Na época somente ela e o outro gestor estavam indo para o presídio para organizar as aulas que seriam dadas de forma virtual pelos professores.

“A gente montava um telão nesse corredor, colocava Datashow, caixa de som, notebook, abria uma sala no Google Meet e os professores ficavam remotamente. Só que antes disso os professores enviam a atividade do dia para a gente, imprimíamos e na hora da aula a gente distribuía para os alunos acompanharem, depois eles faziam e devolviam para nós. Quando os alunos tinham dúvidas eles se dirigiam até um microfone que ficava no notebook para poder falar com o professor”, complementa Cláudia.

De acordo com os professores, esse segundo momento que teve aulas remotas foi mais produtivo porque houve uma interação melhor entre aluno e professor, mas também foi desafiador.

Um dos projetos que a escola também tem é a de produção de sabão caseiro. “Tem uma pandemia eterna lá que é da sarna, e esse sabão que eles produzem ajuda muito a cessar essa epidemia”, diz o professor Emanuel. Fazer esse sabão durante a pandemia, ensinando os detendo de forma remota foi um outro desafio, mas um pouco mais engraçado. Primeiro a equipe de saúde procurou a escola para perguntar se eles podiam fazer uma quantidade para ser distribuída para todos os presos para ajudá-los. 

“Muitos deles não têm um sabão sequer para fazer a higiene pessoal. Foi um grande desafio, mas o professor responsável pelo projeto ficou de forma remota e indicou alguns alunos que seriam os monitores no momento da execução. Foi difícil, mas conseguimos, eles fizeram mil pedaços de sabão e depois teve uma cerimônia para a entrega daqueles sabões”, complementa a gestora.

Do total das escolas pernambucanas, só a Padre André e mais quatro conseguiram desenvolver trabalhos durante a pandemia. As quatros situadas no Sertão, tiveram aula remota. As outras não tiveram essa oportunidade pois muitas serviram como hospital de campanha. 

20 escolas prisionais já conseguiram voltar ao ensino presencial. “Não podemos ser a escola do consta, só para constar, para dizer que existe para dar uma aula e depois os alunos irem embora, a gente precisa ser uma escola que faça a diferença na vida dessas pessoas. Aqui a educação sem demagogia e com verdade”, professor Emanuel.

 

Preconceito

Apesar desses professores fazerem um trabalho muito significante para a sociedade, pois através da educação eles estão dando uma nova oportunidade para esses condenados. Ainda existem pessoas que não conseguem enxergar a importância desses profissionais nesse meio.

“Um dia desses eu pedi para a van parar no presídio, estava descendo quando me perguntaram:

-O que eu ia fazer lá?

-Sou professor.

-Seu vagabundo, não tem vergonha de dar aula pra preso não? Cabra safado.

O preconceito com educação prisional ainda é muito grande e a gente sofre isso na pele”, desabafa Emanuel.

A professora Sônia Vieira do DF, diz que não chegou a sofrer esse preconceito de forma direta e que muitas pessoas quando descobrem onde ela trabalha ficam admiradas, porém ela acredita que esse preconceito existe dentro do seu local de trabalho, “sinto que esse preconceito existe dentro do sistema prisional, principalmente com os agentes que trabalham lá, não são todos, mas tem uma parcela que acha que estamos fazendo errado em dar aula para esses detentos”.

“Muita gente acha que você dar aula em uma escola prisional é como se você quisesse gastar dinheiro da educação com um pessoal que não vale a pena”, diz Silvana. A Secretaria de Educação de Pernambuco preocupada com esse preconceito organizou uma proposta de formação diferenciada para esse grupo, onde eles podem debater as condições de trabalho para promover um melhor engajamento nas escolas. 

 

Esperança para os menores

“A gente respira Paulo Freire”, professora Cláudia.

Na manhã de domingo do dia 8 de maio de 2016, a advogada Magaly Palhares estava no presídio de Brasília em uma ala dedicada aos menores de idade. Era Dia das Mães e enquanto ela esperava, internos do centro de ressocialização chegarem, preparava sua aula. Aos poucos, eles foram chegando, em uma fila indiana, todos com as mãos para trás e com as cabeças para baixo. Alguns estavam acompanhados das mães. 

Tema da aula: Comunicação não-violenta, com uma abordagem especial na violência contra as mulheres, pois era Dia das Mães. “Foi diferente de tudo que eu tinha feito antes e bem difícil porque eu sempre proponho dinâmicas e jogos para criar uma proximidade maior com quem está participando, mas eu não podia fazer, não pude interagir, o máximo que eu podia era conversar com eles mantendo a distância”, diz Magaly.

Os alunos tiveram que assistir à aula sentados com as mãos para trás. A advogada também foi recomendada para manter uma certa distância e avisada que não poderia fazer atividades que exigissem que eles saíssem do lugar. Ela seguiu o que foi exigido, claro, e a aula “correu bem”, ela mostrou alguns vídeos, deu explicações sobre o tema e conversou com eles.

“Eles se interessaram pelo assunto, me interrompiam muitas vezes para perguntar e dar exemplos das realidades que viviam”.

Ela lembra um diálogo:

-Professora, então quer dizer que quando meu pai grita com a minha mãe é um tipo de violência?

-Sim, pode perguntar para ela, para ver se ela não fica magoada.

A advogada participava de uma comissão de mediação e da mulher dentro da Ordem dos Advogados (OAB-DF). Na comissão, surgiu a oportunidade de participar de um projeto de dar aulas e promover atividades nas escolas do entorno do DF. “Muitas vezes, a gente se deparava com escolas situadas em comunidades carentes. Então, a gente encaixa nas atividades e brincadeiras a realidades deles”. Magaly já estava há mais de um ano visitando as escolas quando surgiu a oportunidade de visitar os jovens no presídio.

“Tiveram dois garotos que me chamaram muito a atenção no dia. Os dois estavam sozinhos. Um parecia que estava desconfortável naquele lugar. Ele ficava me encarando com rancor, se mexia o tempo todo, até uma hora que veio um policial e tirou ele. O outro era o contrário. Parecia que os olhos dele brilhavam enquanto eu falava. Ele me fez um monte de perguntas e no final me perguntou como era ser advogada”, diz ela.

Não só os presos, mas os menores  que se encontram em situação de internação, chegam naquela situação por falta de oportunidade, se sentindo fracassados. O estado em que eles se encontram é a ‘morte da esperança’ ”, como diz Leonardo Ortegal, professor de política social da Universidade de Brasília.

“É quando aquela pessoa olha para a vida dela e não tem mais apreço, porque ela entende que a sociedade também não tem mais apreço pela sua vida, pela sua família, pelo território onde ela vive, não tem apreço pela história dela. Ela olha para tudo isso e perde a esperança”. A educação para muitos desses indivíduos se torna a salvação. 

“O papel do educador é fundamental nessa hora, pois ele faz a mediação entre a educação e a realidade daquela pessoa. Ou seja, o educador leva o ensino até a vida dele, a cultura social que ele tem e que foi fragilizada anteriormente por um fracasso cometido. Então, esses jovens e adultos começaram a se sentir valorizados novamente e isso cria uma esperança dentro deles”, complementa Ortegal.

 

Ensino através do trabalho

A Secretaria de Justiça do Distrito Federal (Sejus-DF) promove uma ação socioeducativa, de curso de aprendizagem e profissionalizantes, para esses jovens privados de liberdade com o intuito de incentivá-los a ter uma nova chance através do ensino e do trabalho. Essa aprendizagem dura 10 meses. Durante esse período, o jovem é contratado por uma empresa participante da iniciativa, com registro em carteira e recebendo uma bolsa auxílio. Tanto na parte teórica quanto na prática, o aluno interno aprende dentro da unidade.

Ainda dentro das unidades, a Sejus-DF, em parceria com outros órgãos e empresas, oferece cursos profissionalizantes, com uma carga menor de horas, como o de maquiador, barbeiro e auxiliar administrativo. Para os menores  que estão em meio aberto ou em liberdade assistida, são oferecidos os cursos de uma forma diferente. 

Nesse caso, os cursos são mediados em algumas formadoras, como a Casa Azul. Eles fazem o curso uma vez por semana e nos outros quatro dias eles vão para a empresa participante do projeto para ter a parte prática, o trabalho.

“Esses jovens demonstram muito interesse em participar principalmente da aprendizagem, porque eles recebem essa bolsa auxílio que se eu não me engano são R$ 400. E hoje, esse valor, apesar de ser pequeno, é muito importante e torna-se, às vezes, a única renda de uma família. No início, eles não conseguem enxergar a importância de se profissionalizar, de aprender e da oportunidade que estão tendo. Por causa da situação de vida que têm, só conseguem enxergar o dinheiro como algo para ajudar a família e, no decorrer do curso, trabalhamos isso”, diz a professora e diretora do projeto socioeducativo.

Esses cursos não atrapalham o ensino na escola dos internos. As atividades servem para complementar a capacitação. Os jovens que estão nas unidades de internação fechadas contam com escolas no próprio ambiente. E para os que estão em meio aberto ou liberdade assistida, eles devem voltar a frequentar as escolas que são oferecidas na rede de ensino.

“Considerando que a maioria das pessoas presas, jovens ou adultos, vem de um contexto de pobreza, temos a necessidade de olhar para essa gente que cresceu em uma condição desfavorável e com uma situação socioeconômica muito fragilizada. Para então, a gente como sociedade e Estado, ver o que podemos oferecer, e isso envolve o sistema socioeducativo, a política de assistência social, a saúde básica e outros projetos. No geral, tudo isso representa que nível de cidadania vamos oferecer para essas pessoas”, diz Ortegal.

 

Legado de Freire

“A gente pega na mão do Freire e vai”, professor Emanuel.

O professor e pesquisador Leonardo Ortegal também trabalhou durante 10 anos como assistente social em unidades de internação para menores de idade. E, ele acredita que esse modelo de educação diferenciada tem que ser valorizado tanto para os jovens lá presentes quanto para os adultos nos presídios. E a chave para essa valorização do ensino para esse público é Paulo Freire.

“A proposta de Paulo Freire é desafiadora porque é muito mais fácil você chegar para o garoto e dizer que ele precisa, tem que estudar e que deve  obedecer. Mas, quando você constrói a partir da realidade e participa dessa construção junto, é muito mais difícil de se fazer, mas é o caminho que a gente observa que tem mais resultados”, diz Ortegal.

As professoras Cláudia, Sônia e o professor Emanuel são alguns exemplos, entre outros milhares, que fazem com que a educação prisional saia do papel. “Eu acredito que essa é a minha missão aqui na terra e que ainda não está no fim. Ver esses alunos mudados e ter a sensação de dever cumprido, não tem dinheiro que pague”, termina o professor Emanuel.

 

Por Gabriel da Costa.

Agencia de Noticias Uniceub