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Projeto faz corpo falar através da arte

“Vencedor das ondas, envergo e não quebro, bato de frente. Não vim pra ser galho, sou a semente.” (Ronaldinho Gaúcho, Jhama e Pablo Luiz, 2016)

Arraste os sofás, ligue o som e coloque uma música animada em volume baixo. Sente-se em uma cadeira. Agora relaxe os braços, e então dê início ao seu alongamento. Comece pelas mãos fazendo um movimento de abrir e fechar os dedos, sem parar faça movimentos rotativos com os punhos, cotovelos e ombros. Agora sente-se no chão e relaxe as pernas… vamos alongá-las? Estique uma perna e segure a outra e comece a girar o tornozelo, depois dê leves batidinhas na sola do pé, isso vai ajudar na circulação do sangue, repita o movimento com a outra perna… 1,2,3… 8,9,10. Esses foram os primeiros passos que o professor Rafael Tursi iniciou a aula de dança. Com auxílio de dois cabos de vassoura, Rafael vai ensinando o poder do equilíbrio para alunos e a possibilidade de novos movimentos na dança para pessoas com deficiência.

Formado em artes cênicas pela Universidade de Brasília, UnB, o professor Rafael Tursi, de 34, deu início em 2011 ao Projeto PÉS – Teatro e Dança para Pessoas com Deficiência, que inicialmente seria apenas para servir como uma reabilitação através do teatro e da dança para pessoas que não tivessem a mobilidade das pernas e faziam uso de cadeiras de rodas para se locomoverem. Mas para a surpresa dele, o projeto tomou um rumo completamente inesperado.

Rafael Tursi viu sua vida mudar após o início do projeto. Foto: Juliana Boechat.

Sensibilizado com o acidente de uma grande amiga que ficou tetraplégica, Rafael diz que esse foi o principal motivo de dar vida a algo não tão visto nos meios de tratamento para um portador de deficiência, a dança. “Eu pude acompanhar o tratamento dela no começo, observando como era. Naquele momento que observei, vi muitos tratamentos pelo esporte, pela fisioterapia e pouquíssimas vezes ele abrangia a área das artes, que era a minha área de formação. E ali veio a ideia de trabalhar com teatro e dança para pessoas com deficiência”.

Rafael afirma que nunca tinha tido nenhum tipo de contato com pessoas deficientes a não ser sua amiga, mas mesmo assim resolveu criar o projeto, que de início apenas seria para pessoas sem mobilidades dos pés e das pernas, daí o nome PÉS, seria um projeto para impulsionar essa parte do corpo. E ele teria que entender apenas sobre uma única parte do corpo, mas não foi bem assim…

“Assim que eu comecei de verdade o projeto, apareceu para mim um grupo com cinco pessoas, com cinco deficiências diferentes e nenhum deles eram paraplégicos, e pensei “meu Deus do céu, como vou fazer isso?!”, eu achei que iria ter que dar cinco aulas diferentes, cinco conteúdos diferentes… mas a aula é a mesma o conteúdo é o mesmo pra todo mundo, o que muda é a abordagem, como eu trabalho com meu corpo é diferente de trabalhar com o seu, é diferente de trabalhar com aquele de cadeira de rodas, é diferente de trabalhar com aquele que tem uma deficiência intelectual, e aí a gente foi transformando o projeto. Ele virou uma ferramenta em cima de arte, de teatro e dança para pessoas com qualquer deficiência”.

Desde o início, o projeto, que une dança e teatro, contribui para as pessoas com deficiência e ajuda a mudar o olhar da sociedade e até deles com eles mesmos. O objetivo da iniciativa é mostrar que uma pessoa, mesmo com limitações, pode dançar, pode fazer uma apresentação como qualquer outro ser humano sem limitações físicas.

Rafael Tursi e aluna dançam juntos. Foto: Sofia Leiva Quiroga.

“Eles tinham um pré-conceito entre eles e na hora que eles começavam a fazer, um começa a ver o que o outro fazia e falava “ah, isso ele faz melhor do que eu” “isso não é comigo”, e aí um certo preconceito que vem inclusive do olhar do outro, dessa outra visão sem deficiência que vem assombrando durante muito tempo a vida deles. E quando chegou naquele momento de experimentar, no começo eles se sentiam um pouco retraídos em começar, porém esse exatamente “começar” é que foi dando um impulso, e hoje não, eles falam que não sabem e vão tentar, se desdobram para fazer do jeito deles e hoje eles têm zero problemas com isso”.

Segundo Rafael, o que mais marcou e ainda marca na vida dele é a forma que o projeto o toca até hoje, e como as pessoas com deficiência ajudou a rever os seus próprios preconceitos e ver o mundo com outros olhos. “Eu diria que não tem momentos que eu não pense nisso. É bem piegas, mas é real, eu até brinco que quem tem mais ganho com o projeto sou eu, que me reinventei como pessoa, que me reinventei como professor, que me reinventei como artista (…)”

Para quem ficou interessado pelo projeto e quer ajudar ou até mesmo participar, o professor deixa claro: “toda a ajuda é muito bem-vinda”. É possível ir para tirar fotos, dançar, ajudar na divulgação, na assistência, enfim o Projeto PÉS estará de braços abertos para recebê-los. As aulas acontecem nas segundas e quartas de 10h às 12h no Centro de Dança de Brasília, pessoas de qualquer idade (inclusive crianças) e com qualquer deficiência ou sem podem participar. Para mais informações acesse o sitewww.projetopes.com

Projeto PÉS. Foto: Juliana Boechat.

 

Por Amanda Christina

Supervisão de Luiz Claudio Ferreira